Entidades de agricultores familiares reclamaram da
falta de verbas estaduais para o setor, da burocracia para obter crédito e
defenderam a criação da Secretaria de Estado de Agricultura Familiar, com
destinação adequada de recursos. Juntamente com representantes de órgãos
ligados à área e parlamentares, elas participaram da audiência da Comissão de
Política Agropecuária e Agroindustrial da Assembleia Legislativa de Minas
Gerais (ALMG), no dia 14 de maio.
A reunião foi a primeira neste ano para
acompanhamento de políticas públicas, e é voltada, nesse caso, para acompanhar
a execução de políticas estaduais destinadas a agricultura familiar. Trata-se
de um projeto piloto da Assembleia que busca orientar a revisão do Plano
Plurianual de Ação Governamental (PPAG). A audiência vai gerar um relatório de
monitoramento para orientar a comissão e propiciar ainda a criação de projetos,
emendas ao PPAG, pedidos de providências ao governo, entre outros.
O diretor de Meio Ambiente da Federação dos
Trabalhadores na Agricultura (Fetaemg), Eduardo Nascimento, defendeu a criação
da Secretaria de Estado de Agricultura Familiar e Regularização Fundiária. Ela
seria desvinculada da Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SEAPA)
e passaria ter autonomia financeira. “São atribuições e desafios diferentes da
agricultura familiar e do agronegócio”, constatou. Nascimento também exigiu
mais recursos para a execução das políticas públicas para a agricultura
familiar.
Reforma agrária - O dirigente também colocou como
maior desafio a reforma agrária no País. “O Brasil tem a maior concentração de
terra do mundo e não faz reforma agrária. Em Minas, são 467 mil propriedades de
agricultura familiar, mas que têm apenas 16% da área agricultável do Estado”,
lamentou, lembrando que ainda assim, o setor produz quase 70% dos alimentos.
Concordando com o diretor da Fetaemg Genilton
Miranda, da Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar (Fetraf),
defendeu ainda a destinação de terras devolutas do Estado para a reforma agrária.
Também reivindicou melhoria da assistência técnica ao setor. “Queremos que o
Estado crie um grande centro de distribuição de produtos agropecuários em Belo
Horizonte e nas maiores cidades de Minas. O produtor precisa de estrutura para
comercializar”, explicou.
Francisco Barbosa Simões, da Federação da
Agricultura de Minas Gerais (Faemg), reclamou que o Bolsa Verde, programa
estadual que remunera o produtor que preserva suas nascentes, não vem sendo
pago pelo Governo do Estado. Também solicitou que os órgãos federais passem a
aceitar a inscrição estadual como suficiente para comercialização de produtos
da agricultura familiar, como ocorre nos órgãos estaduais. Nessa linha, Juarez
Lopes Pereira, do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Virgolândia, pediu a
redução da burocracia para o produtor rural.
Subsecretário defende novos instrumentos para
implementar políticas
O subsecretário de Estado de Agricultura Familiar e
Regularização Fundiária, Edmar Gadelha, reconheceu que faltam recursos para
aplicar no setor, mas acrescentou que só dinheiro não basta. “Nosso orçamento
realmente precisa melhorar, mas isso não é suficiente. Precisamos de novos
instrumentos para implementar as políticas públicas”, constatou.
Gadelha disse que órgãos que operacionalizam as
políticas na área, como Emater e IMA, necessitariam dobrar o número de seus
servidores, mas aí se esbarraria em restrições legais, como as previstas na Lei
de Responsabilidade Fiscal. Além disso, ele sugeriu se pensar em novos
instrumentos para implementar as políticas para a agricultura. “Precisamos
avançar como avançou a área de saúde, que permite repasses fundo a fundo e
outros mecanismos. No nosso caso, só atuamos com convênios e licitações, o que
dificulta a liberação de recursos”, afirmou.
Cultivar - Sobre o Cultivar, Nutrir e Educar, programa
estratégico do Estado voltado para a alimentação escolar, Gadelha destacou que
ele foi criado para reduzir um gargalo que ocorria na área, com a
falta de sintonia entre as necessidades das escolas e dos agricultores. Segundo
o subsecretário, os dois grupos foram colocados numa mesa de
negociação, juntamente com representantes do governo, e como resultado se criou
o programa estratégico, que tem como uma de suas diretrizes qualificar os
produtores rurais. O programa já opera em 200 municípios, principalmente do
Jequitinhonha, Norte e Rio Doce.
Sobre o problema de comercialização dos
produtos agropecuários, Gadelha citou como iniciativa da subsecretaria o
incentivo às feiras livres locais. “Estamos apoiando 50 municípios,
principalmente do Jequitinhonha, com kits de feiras livre, mas precisamos de
mais recursos”, solicitou, sugerindo o apoio de emendas parlamentares.
Aquisição de alimentos - O superintendente regional da
Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Osvaldo Teixeira de Souza Filho,
destacou os resultados do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). De acordo
com ele, até abril deste ano, foi possível executar 43 projetos no PAA, que
somam R$ 10,8 milhões. A meta para 2014, afirma ele, é de atingir R$ 50 milhões
nesses projetos.
Juliana Terra, do Ministério do Desenvolvimento
Agrário, disse que o objetivo do órgão é que os programas federais funcionem
bem no Estado. E para isso, o MDA se articula com o Governo de Minas, visando a
facilitar a adequação dos agricultores familiares à legislação e consequente
liberação de recursos.
Melhorias nos órgãos que apoiam a agricultura
familiar
Moísa Lasmar, presidente da Associação dos Fiscais
Agropecuários de Minas Gerais, fiscal do do Instituto Mineiro de Agropecuária
(IMA), reclamou do descaso do Estado com a categoria. “O Estado foi o primeiro
no Brasil a criar uma legislação para a agricultura familiar. Mas se esquece de
valorizar quem presta o serviço ao setor. Temos os piores salários do País na
saúde, na educação e também na agropecuária”, lamentou.
Também Juliana Simões, da Empresa de Pesquisa
Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), disse que o órgão não realiza concursos
há nove anos. E além disso, não valoriza seus servidores pagando baixos
salários. Ela ainda destacou que os editais de pesquisa devem ser direcionados
para a agricultura familiar, o que não vem ocorrendo. “Precisamos pesquisar
aquilo que vai atender aos agricultores familiares, e não à academia”, solicitou.
Juseleno da Silva, da Fetraf Norte de Minas,
defendeu concurso na Emater, para aumentar o número de servidores e melhorar a
assistência técnica.
Falta de recursos - O deputado Paulo Guedes (PT)
reconheceu o esforço dos servidores para apoiar a agricultura familiar, mas
criticou a falta de recursos do Estado destinados à área. “A verba estadual só
daria para atender a um ou dois municípios, que de lá para 853. Só existem
programas no papel”, condenou. Para ele, os investimentos reais na agricultura
familiar têm sido feitos pelo Governo Federal e o Governo de Minas tem,
praticamente, apenas repassado esses recursos.
Para embasar seu discurso, Guedes apresentou dados
do orçamento do Estado de 2013. De acordo com ele, foram destinados ao programa
Cultivar R$ 1,5 milhão, mas executados R$ 1,18 milhão. No programa de
desenvolvimento Sustentável, dos R$ 628 mil destinados, foram executados R$ 325
mil. E no fomento à atividade produtiva, segundo o parlamentar, de R$ 2,7
milhões, apenas R$ 1,5 milhão foi executado.
Concordando com Guedes, Terezinha Trindade, da
Fetraf de Simonésia, disse que os órgãos estaduais não têm estrutura e recursos
para apoiar a agricultura familiar. “As únicas políticas públicas que
conseguimos vêm do Governo Federal. E mesmo assim,quando é necessária a
participação do Governo de Minas, ele não nos apoia”, criticou.
Arcabouço legal - O deputado Rogério Correia (PT)
também qualificou como muito pequena a estrutura do Governo do Estado para
atender à agricultura familiar. Ele ainda lembrou dos avanços legais
propiciados por novas leis aprovadas na ALMG voltada para o setor. “Produzimos
um arcabouço de leis que permite ao setor avançar”, elogiou, lembrando dos
últimos três projetos aprovados que viraram lei: a chamada lei orgânica da agricultura
familiar; outra que trata da agroecologia; e ainda uma que aborda a defesa das
comunidades tradicionais. Na avaliação de Correia, essas normas podem orientar
prefeituras na criação de leis municipais para o setor.
O vice-presidente da comissão, deputado Fabiano
Tolentino (PSD), anunciou que, em agosto, será realizado na Assembleia um ciclo
de debates sobre a agricultura familiar, quando será lançado o Plano Safra
2014. “Vamos realizar a primeira reunião preparatória do evento, na segunda (19
de maio), às 14h30, no Plenarinho I”, divulgou.
Provocado pela reclamação do produtor rural Wilson
Ferreira, de Divinópolis, que reclamou da falta de segurança nas fazendas,
Tolentino lembrou da reunião sobre o tema que a comissão vai promover no dia 4
de junho. “A vida já é tão difícil para o produtor rural e ele ainda tem que
ficar exposto à bandidagem”, lamentou.
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